quinta-feira, 4 de março de 2010

Alice, o coelho, a rainha de copas, a minha "neura" de infância e o crazy quilt

Uau! Mais uma elucubração, Cecilia? Pois é. Já está todo mundo animadinho com a nova versão de Alice no País das Maravilhas, do Tim Burton, com um elenco de primeiríssima.
 
Nesta versão, Alice está mais velha, volta ao País das Maravilhas, mas não se recorda de haver estado lá.
Vi a versão em desenho, também da Disney, quando eu tinha 12 anos, num tempo em que ter 12 anos ainda significava ser criança - nem se conhecia o termo pré-adolescência. Já lá se vão muitos (muitíssimos) anos ...
Mas me lembro perfeitamente da minha angústia, do meu espanto com aquela correria toda, com o Coelho cantando: "É tarde, é tarde, é tarde até que arde!", com  o chá de desaniversário e, principalmente com a Rainha de Copas: "Cortem-lhe a cabeça!". 


A Rainha de Copas do desenho da Disney

Alguns anos mais tarde, tomei conhecimento de que a Rainha de Copas se referia à rainha Vitória da Inglaterra, e que o livro de Lewis Carroll, apesar de ser uma história aparentemente infantil, continha alusões à sua época (século XIX) e foi a obra precursora do surrealismo (e toma surrealismo!).
E quem foi a rainha Vitória? Olha ela aqui em dois momentos, no dia da coroação, em 1837, e na idade madura:



















Seu reinado foi o mais longo da história da Inglaterra: de 1837 a 1901: 64 anos. Foi tão importante que virou sinônimo de uma era - a era vitoriana -, marcada pelo início da industrialização, da expansão econômica, novos padrões de  desenvolvimento urbano, a expansão da imprensa, a invenção da fotografia e grande desenvolvimento artístico e tecnológico. Quem tiver interesse em conhecer um pouco mais sobre a rainha e seu príncipe consorte, o príncipe Albert (gente, foi ela quem o pediu em casamento; ele era tímido: mesmo assim tiveram 9 filhos), a Editora Record lançou em 2001 o livro de Lytton Stratchey, "Rainha Vitória", escrito em 1921.
Bom, isso tudo para dizer que os dois grandes passatempos das mulheres britânicas (e de outras nacionalidades também) da alta classe da era vitoriana  (essa época foi um tempo de contrastes: extrema riqueza e extrema pobreza) eram o bordado e a decupagem (do francês découpage - recorte). Os temas eram muitos: anjinhos, indumentária, pássaros, borboletas, animais, leques ...
 O papel da mulher, no século XIX, era o de "anjo do lar". A educação estava centrada nas artes domésticas e na educação religiosa. A insistência na costura deixava bem claro que sua principal ocupação tinha a ver com a agulha. Os trajes eram elaboradíssimos.

 As lições de etiqueta tinham o objetivo de ensinar-lhes as atitudes de obediência, modéstia e abnegação.  O objetivo da mulher era o casamento, com a consequente obediência ao marido e a dedicação exclusiva aos filhos. Só estou dando uma panorâmica, não estou julgando nada. Então a mulher bordava, bordava e colava, colava ... O passatempo da decupagem gerou o passatempo do crazy quilt ou crazy patchwork. Apesar de ser feito em retalhos, eram retalhos de tecidos finos: seda, veludo, cetim, com bordados lindíssimos, enfeitados do que viesse à cabeça da dama do século XIX.


Neste site há modelos de crazy quilts e os pontos de bordados que podem ser utilizados nos trabalhos. É bom notar que, na verdade, o "crazy" do nome indica mais algo 'quebrado', 'fora do normal', do que propriamente 'louco'; que o  nome "quilt", para alguns historiadores de artesanato, não seria apropriado, já que as peças não são acolchoadas - eles preferem chamar de "crazy pachwork"; e que, em geral ,as peças são pequenas, como almofadas ou enfeites para sofá.
Só para terminar: há um filme lindíssimo, do Luchino Visconti, O Leopardo (Il Gattopardo), que retrata bem, entre outras coisas, a condição da mulher do século XIX. A cena do baile é antológica - Claudia 
EU AAAAAAMO ESSE FILME (e o livro também)  (por Cecilia)

5 comentários:

Rosana Sperotto disse...

Ah, Cecília, adoro suas elucubrações, na verdade, viagens que linkam vários aspectos culturais, muito bem agrupados em patchworks super interessantes. Então, enquanto Alice não chega, vamos nos ocupando de "crazy projetos" que alimentam a alma de beleza... Amei os pequenos retalhos trabalhados com diversos pontos e bordados. Um ótimo fim de semana! Abraço

Clarisse disse...

Sensacional!
Amei...Tenho muito que aprender com essas duas...
Um beijo enorme.

Laély disse...

Puxa, Cecília! Um verdadeiro patch de ideias, informações, imagens, muito bem costuradas. Você é mestra, nisso, literalmente! rsrs
Amei como linkou duas coisas tão díspares: o filme e a técnica crazy. Realmente, os dois são surrealisticamente interessantes.
Tô louca pra ver o filme. Sou fã de Tim Burton e Johnny Depp. O patch do trabalho dos dois, já provou que dá certo, há muitos filmes atrás.
Abraço!

Laély disse...

Ops! Só pra ressaltar: o fantástico piso de azulejos do baile mostrado.

Li de Liége disse...

Sissi!!!!! parece que foi ontem!!!!!!
liége